Hanseníase é lepra: transmissão, sintomas e cura

Hanseníase é lepra: transmissão, sintomas e cura

Lepra é o nome popular da doença hanseníase, uma das mais antigas da humanidade. Para minimizar o preconceito, desde 1976, o Ministério da Saúde proibiu o uso da palavra lepra e passou adotar a nomenclatura hanseníase.

O Brasil ocupa o 2º lugar entre os países que registram o maior número de novos casos todo ano, o que torna um problema de saúde pública no país. Várias ações são feitas para ajudar a população na detecção precoce da hanseníase com intuito de prevenir a transmissão e as sequelas que se tornam incapacitantes.

A doença acomete principalmente os nervos superficiais da pele e troncos nervosos periféricos(localizados na face, pescoço, terço médio do braço e abaixo do cotovelo e dos joelhos), mas também pode afetar os olhos e órgãos internos (mucosas, testículos, ossos, baço, fígado, etc.). Se não tratada na forma inicial, a doença evolui e torna-se transmissível. A hanseníase atinge pessoas de qualquer idade, homens e mulheres, crianças e idosos.

Os pacientes diagnosticados com hanseníase têm direito a tratamento gratuito com a poliquimioterapia (PQT-OMS), disponível em qualquer unidade de saúde. O tratamento interrompe a transmissão em poucos dias, e cura a doença. Se não tratada, ela progride de forma lenta e progressiva, podendo levar a diversas incapacidades físicas.

O que é a hanseníase (lepra)?

A hanseníase é uma doença crônica, infectocontagiosa, que ataca o sistema nervoso periférico. O agente etiológico é uma bactéria álcool-ácido resistente(gram-positivo), com o nome de Mycobacterium leprae.

Como se pega hanseníase (lepra)?

A hanseníase é transmitida pelas vias áreas superiores (tosse ou espirro), por meio do convívio próximo e prolongado com uma pessoa doente que não está sendo tratada. Normalmente, a fonte da doença é um parente próximo que não sabe que está doente, como avós, pais, irmãos, cônjuges, etc.

A bactéria é transmitida apenas pelas vias respiratórias (pelo ar), e não pelos objetos utilizados pelo paciente. Estima-se que a maioria da população possua defesa natural (imunidade) contra a bactéria M. leprae, o que significa que as pessoas podem ter entrado em contato com o bacilo sem contrair a doença. Porém, é sabido que esta doença possui influência genética. Assim, familiares de pessoas com hanseníase possuem maior chance de adoecer.

Quais os sinais e sintomas suspeitos da hanseníase?

1. Manchas esbranquiçadas, avermelhadas ou amarronzadas, em qualquer parte do corpo, com perda ou alteração de sensibilidade térmica (ao calor e frio), ao tato e à dor, que podem estar principalmente nas extremidades das mãos e dos pés, na face, nas orelhas, no tronco, nas nádegas e nas pernas.

2. Áreas com diminuição dos pelos e do suor.

3. Dor e sensação de choque, formigamento, fisgadas e agulhadas ao longo dos nervos dos braços e das pernas.

4. Inchaço de mãos e pés.

5.Diminuição sensibilidade e/ou da força muscular da face, mãos e pés, devido à inflamação de nervos, que nesses casos podem estar engrossados e doloridos.

6. Úlceras de pernas e pés.

7.Caroços (nódulos) no corpo, em alguns casos avermelhados e dolorosos.

8. Febre, edemas e dor nas juntas.

9. Entupimento, sangramento, ferida e ressecamento do nariz.

10. Ressecamento nos olhos.

Apesar de ser comum o surgimento das manchas, existem casos que não apresentam estes sinais.

A bactéria da lepra fica incubada no corpo?

Sim.A hanseníase apresenta longo período de incubação, ou seja, tempo em que os sinais e sintomas se manifestam desde a infecção. Geralmente, surge, em média, de 2 a 7 anos. Há referências com períodos mais curtos, de 7 meses, como também mais longos, de 10 anos.

Quais são as fases da doença até atingir a forma grave?

Início da doença

• Todos os pacientes passam por essa fase no início da doença. Entretanto, ela pode ser ou não perceptível. Geralmente afeta crianças abaixo de 10 anos ou, mais raramente, adolescentes e adultos que tiveram contato com pacientes com hanseníase.

• A fonte de infecção é, normalmente, um paciente com hanseníase multibacilar não diagnosticado devido ao pouco tempo de doença.

• A lesão de pele geralmente é única, mais clara do que a pele ao redor (mancha), não é elevada (sem alteração de relevo), apresenta bordas mal delimitadas, e é seca (“não pega poeira” - uma vez que não ocorre sudorese na respectiva área).

• Há perda da sensibilidade (hipoestesia ou anestesia) térmica e/ou dolorosa, masa tátil (habilidade de sentir o toque) geralmente é preservada.

Diagnóstico: a prova da histamina é incompleta na lesão, a biópsia de pele frequentemente não confirma o diagnóstico e a baciloscopia é negativa.Portanto, os exames laboratoriais negativos não afastam o diagnóstico clínico.

Atenção deve ser dada aos casos com manchas hipocrômicas grandes e dispersas, ocorrendo em mais de um membro, ou seja, lesões muito distantes, pois pode se tratar de um caso de hanseníase dimorfa macular (forma multibacilar). Nesses casos, é comum o paciente queixar-se de formigamentos nos pés e mãos, e/ou câimbras, e na palpação dos nervos, frequentemente se observa espessamentos.

Hanseníase tuberculoide (paucibacilar)

É a forma da doença em que o sistema imune da pessoa consegue destruir os bacilos espontaneamente.

• Assim como na hanseníase indeterminada, a doença também pode acometer crianças(o que não descarta a possibilidade de se encontrar adultos doentes).

• Tem um tempo de incubação de cerca de 5 anos, e pode se manifestar até em crianças de colo, onde a lesão de pele é um nódulo totalmente anestésico na face ou tronco (hanseníase nodular da infância).

• Mais frequentemente, manifesta-se por uma placa (mancha elevada em relação à pele adjacente) totalmente anestésica ou por placa com bordas elevadas, bem delimitadas e centro claro (forma de anel ou círculo).

• Com menor frequência, pode se apresentar como um único nervo espessado com perda total de sensibilidade no seu território de inervação.

Diagnóstico: nesses casos, a baciloscopia é negativa e a biópsia de pele quase sempre não demonstra bacilos, e nem confirma sozinha o diagnóstico.Sempre será necessário fazer correlação clínica com o resultado da bacilos copia e/ou biópsia, quando for imperiosa a realização desses exames.

Os exames subsidiários raramente são necessários para o diagnóstico, pois sempre há perda total de sensibilidade, associada ou não à alteração de função motora, porém de forma localizada.

Hanseníase dimorfa (multibacilar)

• Caracteriza-se, geralmente, por mostrar várias manchas de pele avermelhadas ou esbranquiçadas, com bordas elevadas, mal delimitadas na periferia, ou por múltiplas lesões bem delimitadas semelhantes à lesão tuberculoide, porém aborda externa é esmaecida (pouco definida).

• Há perda parcial a total da sensibilidade, com diminuição de funções autonômicas (sudorese e vasorreflexia à histamina).

• É comum haver comprometimento assimétrico de nervos periféricos, às vezes visíveis ao exame clínico.

• É a forma mais comum de apresentação da doença (mais de 70% dos casos).

• Ocorre, normalmente, após um longo período de incubação (cerca de 10 anos ou mais), devido à lenta multiplicação do bacilo (que ocorre a cada 14 dias, em média).

Diagnóstico: a baciloscopia da borda infiltrada das lesões (e não dos lóbulos das orelhas e cotovelos), quando bem coletada e corada, é frequentemente positiva, exceto em casos raros em que a doença está confinada aos nervos.Todavia, quando o paciente é bem avaliado clinicamente, os exames laboratoriais quase sempre são desnecessários.

Esta forma da doença também pode aparecer rapidamente, podendo ou não estar associada à intensa 13 dor nos nervos, embora estes sintomas ocorram mais comumente após o início do tratamento ou mesmo após seu término (reações imunológicas em resposta ao tratamento).

Hanseníase virchowiana (multibacilar)

• É a forma mais contagiosa da doença. O paciente virchowiano não apresenta manchas visíveis.

• A pele apresenta-se avermelhada, seca, infiltrada, cujos poros apresentam-se dilatados (aspecto de “casca de laranja”), poupando geralmente couro cabeludo, axilas e o meio da coluna lombar (áreas quentes).

• Na evolução da doença, é comum aparecerem caroços (pápulas e nódulos) escuros, endurecidos e assintomáticos (hansenomas).

• Quando a doença encontra-se em estágio mais avançado, pode haver perda parcial a total das sobrancelhas (madarose) e também dos cílios, além de outros pelos, exceto os do couro cabeludo.

• A face costuma ser lisa (sem rugas) devido a infiltração, o nariz é congesto, os pés e mãos arroxeados e edemaciados, a pele e os olhos secos.

• O suor está diminuído ou ausente de forma generalizada, porém é mais intenso nas áreas ainda poupadas pela doença, como o couro cabeludo e as axilas.

• São comuns as queixas de câimbras e formigamentos nas mãos e pés, que entretanto apresentam-se aparentemente normais.

• “Dor nas juntas” (articulações) também são comuns e, frequentemente, o paciente tem o diagnóstico clínico e laboratorial equivocado de “reumatismo” (artralgias ou artrites), “problemas de circulação ou de coluna”.

Diagnóstico: os exames reumatológicos frequentemente resultam positivos, como FAN, FR, assim como exame para sífilis (VDRL). É importante ter atenção aos casos de pacientes jovens com hanseníase virchowiana que manifestam dor testicular devido a orquites.

Em idosos do sexo masculino, é comum haver comprometimento dos testículos, levando à a zospermia (infertilidade), ginecomastia (crescimento das mamas) e impotência.

Os nervos periféricos e seus ramos superficiais estão simetricamente espessados, oque dificulta a comparação. Por isso, é importante avaliar e buscar alterações de sensibilidade térmica, dolorosa e tátil no território desses nervos (facial, ulnar, fibular, tibial), e em áreas frias do corpo, como cotovelos, joelhos, nádegas e pernas.

Na hanseníase virchowiana o diagnóstico pode ser confirmado facilmente pela baciloscopia dos lóbulos das orelhas e cotovelos.

Como é feito o tratamento da hanseníase?

A informação sobre a manifestação clínica da hanseníase em cada pessoa, é fundamental para determinar a classificação operacional da doença como Paucibacilar (poucos bacilos) ou Multibacilar (muitos bacilos) e para selecionar o esquema de tratamento adequado para cada caso.

O Sistema Único de Saúde (SUS) disponibiliza o tratamento e acompanhamento da doença em unidades básicas de saúde e em referências.

Para o tratamento é utilizado o Poliquimioterapia (PQT), uma associação de antibimicrobianos, recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Essa associação diminui a resistência medicamentosa do bacilo, que ocorre com frequência quando se utiliza apenas um medicamento, o que acaba impossibilitando a cura da doença.

Os medicamentos são seguros e eficazes. O paciente deve tomar a primeira dose mensal supervisionada pelo profissional de saúde. As demais são auto-administradas.

Ainda no início do tratamento, a doença deixa de ser transmitida. Familiares, colegas de trabalho e amigos, além de apoiar o tratamento, também devem ser examinados.

Para crianças com hanseníase, a dose dos medicamentos do esquema padrão é ajustada de acordo com a idade e o peso. Já no caso de pessoas com intolerância a um dos medicamentos do esquema padrão, são indicados esquemas substitutivos.

A alta por cura é dada após a administração do número de doses preconizadas pelo esquema terapêutico, dentro do prazo recomendado. O tratamento da hanseníase é ambulatorial, ou seja, não necessita de internação.

Tem como prevenir a hanseníase?

O diagnóstico precoce e o tratamento oportuno da hanseníase são as principais formas de prevenir as deficiências e incapacidades físicas causadas pela hanseníase.

A prevenção de deficiências (temporárias) e incapacidades (permanentes) não deve ser dissociada do tratamento com a medicação PQT. As ações de prevenção de incapacidades físicas fazem parte da rotina dos serviços de saúde e recomendadas para todos os pacientes.

A avaliação neurológica deve ser realizada:

• No início do tratamento;

• A cada 3 meses durante o tratamento, se não houver queixas;

• Sempre que houver queixas, tais como: dor em trajeto de nervos, fraqueza muscular, início ou piora de queixas parestésicas;

• No controle periódico de pacientes em uso de corticoides, em estados reacionais e neurites;

• Na alta do tratamento;

• No acompanhamento pós-operatório de descompressão neural, com 15, 45, 90 e 180 dias.

Características epidemiológicas

A hanseníase está fortemente relacionada às condições econômicas, sociais e ambientais desfavoráveis. Com registro de casos novos em todas as unidades federadas, exibe distribuição heterogênea no país, com elevadas concentrações nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, importantes áreas de transmissão da doença.

Sua alta endemicidade compromete a interrupção da cadeia de transmissão. Além disso, soma-se a estes fatores a dificuldade de acesso à rede de serviços de saúde pelas populações mais vulneráveis, tornando-se imprescindível a incorporação de ações estratégicas que visam garantir o atendimento integral as pessoas acometidas pela doença.

A procura dos casos de hanseníase deve se dar na assistência prestada à população geral nas unidades de saúde dos municípios brasileiros, bem como pela investigação dos contatos domiciliares e sociais dos casos diagnosticados, conforme recomendações das diretrizes nacionais.

Para mais informações sobre o tratamento da hanseníase, acesse o site do Ministério da Saúde. A informação é uma das formas de prevenção, já que o diagnóstico precoce e tratamento evitam a gravidade da doença. Compartilhe informações de saúde com seus amigos! Você pode estar ajudando alguém.

Medicina Mitos e Verdades: Médico Infectologista Prof. Dr. Vicente Amato Neto, Dermatologista: Prof. Dr. Luiz Carlos Cucé